9/04/2006

Campanella & Brant mostrando serviço, um Cronenberg revisto, Steve Martin vice-versa...


Na crítica cinematográfica, costuma-se falar muito em obras baseadas em romances tidos como "infilmáveis". Naked Lunch, livrinho claramente escrito sob efeito de drogas pesadas pelo doidão William S. Burroughs e transformado em desconcertante obra-prima por David Cronenberg em 1991, merece esse jargão mais do que qualquer outro. Sabendo que a tarefa era impossível, e mandando uma grande banana para a indústria que mais mata artistas no mundo (thaaaaat's Hollywood), Cronenberg foi lá e fez Mistérios e Paixões. Fico imaginando as pessoas que alugam um filme pelo título dando de cara com gente viciada em veneno de barata, enrustimento homossexual e alucinações capazes de transmutar máquinas de escrever em insetos gigantescos, com esfíncteres falantes e repletos de secreções.
Tinha visto o filme uma vez só, em VHS, lá pelos meus 12, 13 anos. Boa parte dele permaneceu comigo, e essa sensação, espero que alguém aí já tenha tido, é boa demais. O ex-Robocop Peter Weller é impecável como Bill Lee, escritor frustrado que extermina baratinhas para pagar suas contas. Sua mulher Joan (Judy Davis, amarga que ela só) está viciada no barato que o pó lhe causa; Bill dá uns tecos na substância e entra num processo interminável de viagens. Chega uma hora em que, tão alucinados quanto ele, já não sabemos diferenciar a verdade e o delírio. Uma proeza beatnik, feita sob medida para o grande público odiar de verdade. Donos de mente aberta e estômago forte, façam sua parte e amem-no, amem-no com todas as forças. Nota 9.

Meu amigo Rodrigo resumiu bem Piratas do Caribe - O Baú da Morte na saída do Cine Figueiras: enquanto ação, é melhor(zinho) que o primeiro; já o roteiro parece ter sido escrito a quatro mãos por Renato Aragão e Ronaldo "Chespirito" Bolaños. Isso aí. Fora o enredo, o qual nem é bom lembrar, é dose suportar quase duas horas e meia de gente feia, suja e unilateral - tirando Orlando Bloom e Keira Knightley, todo mundo parece interpretar com uma colher de sopa de Nescau na boca. Tudo bem que dentistas eram raros na época, mas aquilo lá já é demais. Nota 6.

Eles tinham razão: Tomilidiones é mais diretor que ator. Três Enterros, seu début, revela um cineasta literalmente com as rédeas na mão e calejado na direção de atores. Muito além do que aquele rosto durango e cheirando a pêlo de cavalo mostra na telona. Vai pegar a câmera, homem! Nota 7,5.

Não percam os extras do DVD de Crime Delicado. Acompanhar de pertinho o sessentão Walter Carvalho, um dos maiores fotógrafos do cinema, explicando com minúcias o seu trabalho enquanto queima unzinho sentado à mesa de bar é algo que não tem preço. O filme, ainda mais imperdível, traz uma coleção de planos fixos per-fei-tos; numa seqüência em particular, toda desenrolada em cima do palco (aprende, Camurati), o Nachtergaele faz questão de reforçar quem é o melhor ator do Brasil. A dobradinha Beto Brant-Marco Ricca (de O Invasor) é para ficar de olho. Nota 8.

V de Vingança tem algumas boas idéias e impecáveis elenco e produção. Deve fazer bonito nas locadoras, mas de NOVO, de empolgante e inspirador como se pensava que fosse, traz pouco. Será que eu esperava um novo Matrix? Os colhões da fita são inegáveis, ainda mais nesses tempos de WTC: fala-se em bioterrorismo, escutas ilegais, campos de detenção... Assumidamente esquerdista, essa adaptação de Alan Moore é dirigida meio no susto pelo estreante James McTeigue, assistente de direção na trilogia de Neo; os Wachowski só assumiram o roteiro e a produção. Algumas ideologias impostas pelo roteiro são questionáveis (mostrar o terrorismo como única saída para fazer o bem, por exemplo), e certas seqüências pediam um pouco mais de intensidade, de sangue mesmo. O negócio é deixar o som no volume mais alto possível e se empanturrar com aquela pipoca do saquinho rosa. Nota 7,5.

Muito se falou na revolução que O Coronel e o Lobisomem provocaria nos efeitos digitais brazucas, que seria um divisor de águas e blablablá. Coisas da produtora Paula Lavigne. Qualquer Um Lobisomem Americano em Londres, feito num longínquo 1981, bate ele. O filme não é engraçado, romântico ou assustador. Diogo Vilela e sua barba Los Hermanos não incomodam tanto, mas Selton Mello e Ana Paula Arósio estragam a festa. Que vozinhas irritantes, e (agora me referindo só a ele) que desperdício de ator. Investir em efeitos não é mesmo coisa pra artista brazuca, mas de acertar o tom do elenco a gente entende, né? Quem não lembra do medão que dava quando pintava o professor Astromar em Roque Santeiro? Aproveitando a deixa, por que não incluíram na trilha aquela "mistérios da meia-noite, que voam longe..." no lugar de três ou quatro faixas do Caê, hein Paulinha?? Nota 5,5.

Quando o ator é realmente interessante, não dói tanto ter de agüentar filmezinho de doença da semana. Sem William H. Macy, talvez De Porta em Porta fosse mais um desses Supercines chororôs. Bom que o renegado astro de Magnólia e Boogie Nights faz questão de mostrar que papéis centrais são com ele mesmo. Nota 7,5.

Quem sente saudade da época de Antes Só do que Mal Acompanhado, Roxanne e Um Espírito Baixou em Mim não vai saná-la com A Garota da Vitrine. Pelo contrário, vai conhecer um Steve Martin sério e contido. Sua atuação não é digna do Oscar; já o roteiro, de sua autoria, pode ganhar alguns admiradores, em especial os fãzocas de Lost in Translation e Rushmore. Claire Danes e Jason Schwartzman me conquistaram de vez. Nota 7,5.
Mais óbvia, a nova A Pantera Cor de Rosa traz o Steve Martin que todos gostam: paspalhão, cara de pau e dono de uma incomparável expressão corporal. Aqui ele protagoniza muita piada vista e revista, mas eu já havia esquecido de ter dado duas gargalhadas, daquelas de ficar sem respirar, numa comédia. Mesmo não sendo a oitava maravilha, não é tão merdão quanto se pintou por aí. Nota 6,5.

Lá pelas tantas de Clube da Lua, Eduardo Blanco e Ricardo Darín estão confortavelmente sentados num sofá, assistindo à TV e discutindo sobre suas vidas amorosas. Papo vem, papo vai e aí o primeiro se vira e liberta uma sonora flatulência quase na cara do outro. Se o peido foi mesmo de verdade eu não sei, mas o ato ilustra bem essa primeira trinca concluída pelo diretor Juan José Campanella (fecham o pacote O Mesmo Amor, a Mesma Chuva e O Filho da Noiva): um esforço conjunto natural e que flui como poucos, cujo resultado vê-se na tela, integral, do trabalho com o cast à fotografia e a montagem. Gosto de pensar que o clima de confraternização visita o set todo dia. E as lágrimas também. Pensando seriamente em comprar uma camiseta da Argentina. Nota 8,5.

Só a idéia original já é merecedora de alguns prêmios. Totalmente Kubrick exibe o manjado carimbo de "baseado em fatos reais", com atrações extras para os cinéfilos. Trata-se da história real de Alan Conway (John Malkovich, a-do-ran-do a função); apesar de nada saber sobre o trabalho de Stanley Kubrick, ou mesmo ser parecido com ele, esse picaretão resolveu tocar o terror e convenceu uma série de pessoas que era o diretor durante as filmagens londrinas de seu canto de cisne, De Olhos Bem Fechados. O responsável por este Colour me Kubrick, Brian Cook, foi diretor-assistente do cineasta em Barry Lyndon e O Iluminado, entre outros. Deve ser por isso que a produção funciona ao também salpicar, aqui e ali, referências e brincadeiras com a obra do mestre. Cool. Nota 6,5.

No fone: Bob Dylan - "Rollin' and Tumblin'"

3 comentários:

MOVIEMAD disse...

as-montanhas-têm-olhos fica pro próximo post então?!! feeeeeeeeear

Anônimo disse...

bah... esse mistérios e paixões já tem em dvd? preciso ver!!!

Anônimo disse...

alguns eu vi, outros dormi (pra variar)
outros nem fui convidada a assistir no cinema, então, sem comentários... :)
PS: na outra encarnação quero vir jornalistade cadernos haha lovi